sexta-feira, 28 de outubro de 2016

MANUEL ALEGRE : "CADA POEMA É UMA DERROTA PARA A INDIGÊNCIA POLÍTICA, CULTURAL E ATÉ MESMO LITERÁRIA"





Manuel Alegre, poeta e político 
(Portugal) 




          "A Literatura nasceu da linguagem e da imaginação. Poetas e romancistas continuam, com palavras, a tentar mudar e reinventar a vida.  E, às vezes, a tentar adivinhar, porque a escrita continua a ser uma vidência.   

         Não sei falar de Literatura nem de poesia. Nem sei se uma está relacionada com a outra.  A Literatura, para mim, é uma espécie de cerimônia de exorcismo, de libertação, não de purga.  Escrever sempre foi um estado de graça, mesmo nos tempos mais terríveis, de guerra, de prisão, de exílio, de despedidas.  Rejeitaria a possibilidade de ser um daqueles poetas intemporais ou fora da História.  (...) 

          A atividade poética é revolucionária por natureza. 

          Escrever é um acontecimento cósmico e cada palavra é um palácio do universo.  Não sei se é a existência ou se é a vida que se transmuda em palavras.  Creio que, para escrever um só verso, é preciso ter visto muitas cidades, conhecido muitos homens.  

          Que sentido tem hoje a poesia num mundo governado pela ganância e pela estupidez ?  Há o peso, não da ditadura, mas de forças invisíveis a que chamam mercados e que roubam as reformas aos velhos e o futuro aos jovens.  É para isso que serve a poesia hoje.  Cada poema que se escreve é uma derrota para a indigência política, cultural e até mesmo literária e da regressão civilizacional que hoje estamos a viver."  


(MANUEL ALEGRE, na 17a. edição do "Correntes d'Escritas", 
Póvoa de Varzim, Portugal - Fevereiro de 2016 - 
http://www.cm-pvarzim.pt)